11 de nov. de 2015

O dia que quase morri - Parte 1

Sempre tive dificuldade em interpretar os sinais que meu corpo está me dando sobre alguma coisa. Não sei falar isso sem parecer um retardado mental, mas vamos lá: Era um final de semana qualquer em 2012, época que eu aparentemente tinha grana infinita, porque ia a todas as festas – de quinta a sábado- e bebia pra caralho em todas elas.
Pois bem, depois de uma festa, acordei com aquela ressaca tradicional, mas essa era um pouco mais incômoda...uma sensação de que eu havia sido estuprado por um rinoceronte bem dotado. Era uma mistura de dor nas costas com dor na barriga.
A primeira coisa que pensei foi “caralho, que sensação estranha. Acho que meu siso está nascendo. Vou passar um fio dental”.
Continuei os meus afazeres matinais normalmente, imaginando que aquele incômodo passaria, e fui assistir a algum desenho animado porque acredito que essa é a melhor maneira de lidar com os problemas.


A dorzinha achou que não estava recebendo a devida atenção e resolveu se manifestar de forma mais efetiva. Puta que pariu, agora sim. Era como se estivessem enfiando e girando na minha barriga aqueles talheres da Disney.


Imagina esse rato te perfurando

Foi a hora em que decidi que o que estava dentro de mim (aparentemente Satanás), precisava sair e fui vomitar para dar aquela limpada na alma. O que eu tinha esquecido era o quão doloroso o ato de vomitar é por si só – a não ser que você tenha bulimia, não é feliz fazendo isso.
Na hora de comer aquelas amigáveis Pastelinas elas desciam tão facilmente, chega a ser incrível como na hora de subir parecia que vinham elas junto com a porra do próprio demoniozinho Pastelino num skate fazendo manobras radicais nas minhas entranhas.

"Sofre aí, caraio..."

Olhos lacrimejando, aquelas cuspidinhas com fios-de-baba de vômito e a sensação de missão cumprida. Dei aquela escovada nos dentes e tava pronto para seguir minha vida. Aí a dor voltou. Com tudo.
Ok, eu definitivamente estava morrendo. Nessa hora foi tão forte que caí no chão, comecei a chorar que nem uma garotinha em posição fetal e gritei pra minha mãe.

Tentei não desesperá-la e explicar a situação com calma de forma que ela me ajudasse:
 
– MÃE EU TO MORRENDO MÃE PELO AMOR DE DEUS NÃO ME DEIXA MORRER
– O que foi, Beto?
– Ó LÁSTIMA. Ó DERRADEIRO FIM DA VIDA ESTOU A PARTIR DESTE PLANO
– Por que você tá caído no ch…
– TAL QUAL GETÚLIO VARGAS SAIO DA VIDA PARA ENTRAR NA HISTÓRIA
– Tá, eu vou ligar pro teu pai pra ele fazer algo
– QUEM TE VÊ PASSAR ASSIM POR MIM NÃO SABE O QUE É SOFRER TER Q…
 
Meu pai veio correndo me levar pro hospital. Enquanto eu esperava, a minha mãe, que nunca teve um diploma de medicina, achou que poderia resolver a situação por conta própria e, como uma curandeira indígena, ficou esfregando um Vick Vaporub com Gelol nas minhas costas. Ele chegou, fomos pro hospital.
Depois de uma pontada dentro de mim a cada curva que o carro fazia no caminho - aparentemente meu pai pegou as ruas com mais buracos possíveis - cheguei lá com cara de óbito e besuntado de Gelol com Vick. A situação era bem triste.
O médico me levou para um daqueles leitos, tacou-lhe morfina nas minhas veias e eu tava revigorado. Morfina provavelmente é o nome de algum anjo da Bíblia pois aquilo ali foi a sensação de alívio mais gostosa da minha vida.
Daí parti para uns exames rápidos, mijei em um copinho e fiquei aguardando o resultado com um sorriso no rosto porque depois da morfina nada me parava.



“FALA BETÃO! CHEGARO OS RESULTADOS CARAI” foi o que ouvi a enfermeira dizer, pois possivelmente eu estava mais drogado do que deveria depois de tanta morfina.

E eu lá sempre sorridente.
Ela prosseguiu: “blá blá blá leucócitos blá blá blá bastonetes blá blá você está com sangue na urina”.
VOCÊ. ESTÁ. COM SANGUE. NA URINA.
Acabou sorriso, acabou morfina, acabou solzinho dos Teletubbies iluminando a minha vida. 
Essa frase é muito ruim de se ouvir e na hora eu já me visualizei mijando rios de sangue, menstruando pelo pau e o desespero voltou:
 
– É CÂNCER NÉ DOUTORA EU TO COM CÂNCER
– Eu sou só a enfermeira, mas não, você tá com…
– COM OS DIAS CONTADOS NÉ MULHER? PARE DE JOGUINHOS PARE DE RODEIOS, ME CONTAA
– É um caso simples de cálculo renal. Você deixa…
– DEIXO A VIDA PARA ENTRAR PARA A HISTÓRIA TAL QUAL GETÚLIO VARG…cálculo renal?
– É. Pedra nos rins. Basta você beber muita água e tomar esses remédios que elas saem naturalmente.
– Ah ok.
 
Voltei pra casa e os dias seguintes foram aquela agonia. A qualquer momento uma pedra iria passear pelo mêu pênis como se estivesse dando uma voltinha em um shopping. Eu sabia que na real a pedrinha era só isso:

Mas como eu nunca tinha passado por essa situação antes, pra mim era isso:

Eu já ia mijar achando que a qualquer momento sairia um Onix do pokémon da minha uretra e eu desmaiaria durante o ato. Acabou que um dia aconteceu. Foi extremamente tranquilo o processo, não senti dor nenhuma. Olhei pra ela, ela olhou pra mim e sabíamos que aquilo era um adeus.



Um dia de merda

Como toda pessoa nesse universo, era necessário se alimentar. Aos 12 anos então, os meninos principalmente, encontram-se na fase que qualquer coisa minimamente comível é passível de ser devorada. E comigo não era diferente. Porém, tudo que entra...sai.

O problema é que se você não for um mendigo - você não pode sair cagando por aí e a necessidade de expelir nossas fezes (cagar, no caso) nem sempre se manifesta num local propício.

Lidar com esse tipo de situação já é difícil quando você é adulto. Agora imagine uma criança de 12 anos passando por isso. Eu estudava na sexta série, pré-adolescente, começando a ficar gordinho, cheio de espinhas e cheio de sonhos.

O dia tinha aquele ar estranho, de que algo daria errado, e foi na aula de física, entre as tediosas explicações da prof Íris, que ela veio. O mais estranho é que não foi aquela dor de barriga que vai acumulando, ela chegou do nada, sem sequer dar bom dia.

Como não era na minha casa, o pensamento inicial foi “vou prender, porque não cago fora de casa. Sou uma criança de princípios” mas era como se eu tivesse tomado dois litros de Activia estragado no dia anterior e estivesse com cocô acumulado até a garganta.
Comecei suar frio e pedi à professora para ir ao banheiro e percorri o que aparentou ser o caminho mais longo da minha vida. Suor no rosto e um senso de direção e raciocínio consideravelmente alterados, porque – apesar da minha sala ser pertinho do banheiro, eu errei a direção, prolongando ainda mais a tortura-. Entrei no banheiro como uma chita na savana e fui direto para ao último box.


*Vamos aqui lembrar ao detalhe de que sempre usava camisetas grandes, tipo três vezes maior que deveria. – Guarde essa informação.

Era mais ou menos isso o que eu vestia.

Sentei no assento sanitário e libertei o o que me prendia com uma pressão de aproximadamente 75 atm. Para quem não é muito íntimo dos conceitos da física, é como se eu estivesse peidando uma pequena bombinha amarrada num foguete da NASA. O alívio foi imediato. Mas ainda tinha muita merda por vir. Literalmente.



Devidamente aliviado, o normal seria voltar à aula de física para que o dia seguisse normalmente. Aquele dia, infelizmente, estava disposto a foder minha vida. Eu havia cometido o pior erro que um aluno do Ernesto poderia cometer no banheiro: fui direto pro box.

Explico: Devido à guerrinhas de papel higiênico molhado, a direção do colégio resolveu deixar apenas UM rolo de papel, que ficava disponível logo na entrada. Portanto, se você quisesse fazer o numero 2, era preciso todo um planejamento – difícil demais pra quem estava com o demônio dançando carnaval na barriga. Logo, com a carga despachada, eu me vi numa situação desagradabilíssima, pois eu não tinha papel higiênico. Em cerca de 10 minutos começaria o recreio e todos iriam ao banheiro. Eu me vi numa cena de filme de ação, com a contagem regressiva rolando. Um Jack Bauer que lidava com cocôs ultraviolentos. 

Minha criativa mente infantil não teve dúvidas do que fazer quando olhou para o meu pé e viu uma meia. Por favor, não me julgue. Eu era uma criança e era o que eu tinha ali.

Limpei meu simpático bumbum com a meia e percebi que havia OUTRA COISA errada. Lembra que eu disse que usava camisetas grandes? Então, ela tava meio pesada e eu me dei conta de que no desespero, havia esquecido de dar aquela levantadinha nela pra não sujar e aí foi estado de calamidade pública...
Eu nunca imaginaria que uma criança poderia pensar em suicídio, mas ali eu vi que existem casos.
Eu precisava agir. Tirei a camisa de forma tão rápida que acabei com coliformes fecais nas costas E no cabelo, fazendo aquele rastro ao longo do percurso, tipo uma listra de bosta.

É o máximo que posso fazer para vocês visualizarem.

Caso você ainda tenha dúvidas: sim, eu já estava chorando. Chorando e cheio de cocô no corpo. Sentado no chão de uma cabine sanitária. Se a Loira do Banheiro aparecesse ali eu acho que até ela teria pena daquela criança que parecia ter saído de um esgoto. Engoli o choro e pensei nas possibilidades. Tirei o "excesso" da camisa e limpei o meu corpo, a essa altura, com manchas de cocô por toda parte. Mas sabe com o que eu limpei? Isso mesmo...com a outra meia.
 
Eu já não ligava mais para o conceito de dignidade – E olha que nem sabia o significado disso na época. Voltei à ação. Como era só a parte de baixo da camisa que estava suja, botei pra dentro da calça, molhei o cabelo na pia, fiz meu topete e voltei pra sala.

O que foi, galera?

Eu crente que era porque a camisa pra dentro da calça estava charmosa. Sentei me sentindo o cara até que minha colega vira pra mim e fala “cara, tu tá todo cagado né? Que cheiro é esse?”.

Olhei de novo para a turma que, em vez de me achar charmoso, estava possivelmente cochichando “aposto que é merda. Ele tá cagado, certeza” e rindo de mim. Saí da sala, fui para a secretaria da escola, pois eles forneciam roupas extras em casos de sujeira e dei de cara com o diretor.

Sinceramente, acho que para a situação ficar pior, só faltou ele me expulsar e mandar uma equipe do zoológico me buscar. Mas fui extremamente sincero e pedi por uma nova camiseta pois aquela estava TODA CAGADA e não tinha como continuar naquela situação abaixo da linha da miséria. Seu Erno, homem de bem, me deu uma camiseta e voltei para o banheiro para me trocar viver feliz para sempre.

Tenho quase certeza de que até hoje a faxineira do colégio se pergunta antes de dormir o que aconteceu naquele banheiro para ter duas meias e uma camisa no lixo, paredes e pia, todas sujas de excrementos infantis.

30 de abr. de 2014

Mil significados


Estar sozinho tem mil significados. Talvez você se sinta mais especial do que o resto do mundo ao seu lado ou pode ser que você esteja esperando o seu príncipe encantado (ou princesa, dependendo do caso), pode ser, simplesmente, que você desistiu de procurar, que tentou até ficar cansado.
Talvez você esteja bem assim, que aprendeu que se relacionar precisa ser um meio, um caminho, nunca um fim. Talvez, depois de um tempo, você tenha descoberto que dividir a vida traz junto um monte de nãos e que você tem preferido aquilo que te traga o sim. 

Talvez seja só uma fase, nada além, que prefira ficar sem companhia do que aguentar qualquer pessoa só para dizer que tem alguém. Pode ser que você seja o suficiente, que enquanto o mundo gira à procura de um amor, a sua busca seja por algo menos consciente, intransigente, um tanto quanto diferente.

Talvez seja só da boca para fora, que a verdade é que você dorme e acorda pensando nessa demora, que a situação te oprime, te apavora. Pode ser que estar sozinho te deixa triste, que se apaixonar seja a única vontade que existe, que a busca seja a única constante que resiste. 

Talvez ficar sozinho não seja um bicho de sete cabeças, não seja tão ruim quanto pareça, não vai fazer com que seu sentimento adormeça. Talvez seja só uma escolha, uma opção, vontade de ocupar com outras coisas o coração, uma espécie de inabilidade temporária de se construir uma relação. Pode ser que para alguns seja um problema, mas que para você seja a mais sensata solução. Pode ser que tudo mude ao atravessar a rua, que o desejo se transforme quando mudar a lua, que quando chegar o inverno a carência se acentue. 

Talvez fique tudo igual, tudo como sempre, tudo normal. Que com o tempo você descubra que não é bom, mas que também não é de todo mau. Pode ser que você se acostume no começo e se arrependa no final, que evite o doce e exagere no amargo, no sal. Pode ser que a vida seja plena sendo um, sendo dois, que a vontade nunca venha ou que apareça depois.

Talvez, pode ser. A gente só vai saber se pagar para ver.

19 de mar. de 2014

Esperando o ônibus




O ônibus de todo mundo chega.
O meu está demorando mais do que eu queria, mas talvez já avisto ele chegando lá na esquina de cima.
Confesso que já o vi de longe algumas vezes, mas ele sempre fazia uma curva e sumia.
Tenho um pouco de receio de pegar o ônibus errado e para onde ele pode me levar.
Vai que seja longe demais pra voltar?
O ônibus parece bonito, dando cor à cidade cinzenta.
Talvez seja bom confiar na intuição e não se preocupar com o destino.
Talvez eu devesse pegar o ônibus e colocar mais cor na minha viagem.
Talvez ele está demorando tanto a chegar porque é o ônibus certo.
Talvez ele nunca chegue, também. Nesse caso, seguimos à pé mesmo.

24 de jan. de 2014

Não reclame


Não reclame da situação que você permite, do erro no qual você insiste, de quando, no meio do caminho você não segue, desiste.
Não reclame do tempo que você perde quando não vive só existe, quando a história segue e você não participa só assiste, quando não se permite e resiste. 

Não reclame do excesso de drama quando é você quem está escrevendo a sua trama, quando quer quente, mas não acende a chama, quando repete os equívocos e não entende a fama.
Não reclame só por reclamar, porque não encontrou uma solução ou porque não tem o que falar.

Não reclame do que te sobra quando te falta amor, do peso nas costas quando não se tem humor, de que não te valorizam quando nem você se dá valor.
Não reclame da falta de ar quando você escolhe não respirar, de que não te ouvem quando você prefere calar, de que tudo está errado e você segue imóvel, impassível, sem querer se movimentar.

Não reclame, não clame. Apenas ame.

P.s: A criação da imagem é minha.

10 de jan. de 2014

Foda-se também é amor


- Você não precisa me buscar sempre em casa.
- Por que não?
- Eu não quero, eu acho chato.
- Foda-se, eu que não vou ficar esperando horas até você conseguir um táxi ou ônibus!
- Você não tem que me trazer em casa toda vez que saímos.
- Por que não?
- Porque não, ora, eu pego um ônibus ou um táxi!
- Foda-se, é mais um tempo que conversamos. Vou te trazer todas as vezes!
- Não, eu não quero que você me dê isso de presente!
- Mas você não tá precisando?
- Sim, mas tenho essa aqui que ainda uso.
- Essa coisa velha, pequena e gasta?
- É, mais tenho conseguido resolver com ela, então, não precisa…
- Foda-se! eu vou te dar de presente porque eu quero!
- Eu te devo desculpas. Desculpa mesmo.
- Pelo que você está me pedindo desculpas?
- Você me encheu o saco, mas eu reagi muito mal e deixei você chateado.
- Ah, foda-se, era o que tu estava sentindo na hora. Passou.
- Se não dá para nos vermos esta semana, fica para a próxima.
- Eu mudei meu compromisso, a gente pode se ver amanhã!
- Mas você não tinha que ir lá sem falta?
- Foda-se! Eu que não vou ficar sem minha terapia semanal!
- Está chovendo, nosso programa não vai rolar...
- Como não? por causa de uma chuva?!
- Mas, mas… chuva é igual a ficar em casa.
- Deixar de nos ver por uma chuvinha de merda? Nem pensar! Foda-se, passo aí pra te pegar!
E me pegou,
de foda-se em foda-se,
em admiração e amor.